domingo, 5 de dezembro de 2010

De quando mandei Deus à merda

A primeira vez que mandei Deus à merda foi talvez na adolescência, naquela fase confusamente insegura, em qual se começa a perceber certos segredos... no banheiro.

Também pudera, não tinha paz. à todo lugar que eu ia, lá estava Deus em cima, a encher-me o saco com sua inconveniênte onipresença. fechava bem a porta do banheiro mas de nada adiantava. conseguia vê-lo mesmo assim olhando para mim, e com uma cara bem feia de reprovação mostrando também sinais de aplicar-me posterior castigo.

Mais tarde, distraídamente acertava uma martelada tão desgraçada em meu dedão, e já sabem: odiosamente xingava Deus, e até a mãe dele.
Deus pegava muito no meu pé, e assim, não foram poucas as vezes em que ao entrar no banheiro, não me esquecia de antes mandá-lo à merda!

Criado em colégio de freiras Salesianas, Deus pintado em meio à nuvens na capela, era assim que o imaginava, sisudo, olhando tudo o que acontecia abaixo. nunca conseguia imaginar Deus sorrindo. portanto, minha relação com Deus nunca foi muito amigável. as vezesficava de mau por uns bons tempos, seguindo só, depois aceitava-o de volta por reivindificações.

Talvez foi quando meu irmão morreu que conseguí mandar Deus definitivamente à merda.

Tinha dezenove anos, sua morte foi provocada por afogamento quando pescava só num final de tarde. um inútil foi esse Deus que tanto dizem nunca nos abandona:

- oh, Deus! voce estava lá e nada fez?

- nem ao menos o cadáver logo nos revelou prolongando a agonia, pois os bombeiros o procuraram por três dias?

- como poderei crer em algo assim que deixa as piores desgraças acontecerem sem mover uma palha?

E que não venham aqueles por séculos doutrináriamente resignados, os quais nunca tiveram a coragem de abandonar a cômoda idéia Deus me dizerem: - talvez foi melhor assim, pois se Deus quis assim...

-não. não foi melhor assim. passados mais de 20 anos ainda dói! - e por qual razão toda uma boa família e amigos tiveram repentinamente que passar pelo trauma da perda jovem?

Desde aí comecei a desconfiar seriamente da não presença de um ser divino, pois é tão claro que tudo ocorre tão estranhamente selvagem. sem aviso, a encosta desce do morro implacável, soterrando preciosas e amadas vidas. lá fora, na escuridão cósmica, meteoros perigosamente viajam podendo nos causar sérios danos.

Por que não aceitar que éramos simples primatas inventivos que até deuses criamos para solucionar respostas quais não tínhamos?

Cuidemos bem de nossas crianças, pois cada vez mais se tem a certeza de que nada há lá em cima olhando por elas.

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